segunda-feira, 27 de abril de 2009

Óbvio, mas nem tanto

As coisas mais óbvias geralmente são aquelas que passam mais despercebidas e por isso mesmo deixam de ser óbvias. Com o tempo se torna dispendioso pensar sobre uma idéia tantas vezes repetida, mas que na prática raramente acontece. A banalização de pensamentos vai nos acostumando a permanecer na situação cômoda de não buscar quebrar a cabeça ou refazer valores pessoais. É óbvio que isso dá trabalho e se está bom do jeito que está, por que mudar?

Um exemplo de um pensamento bem óbvio “não adianta insistir no diálogo com uma pessoa que não entenda o que você diz”. Simples demais, mas a necessidade de fazer com o que o outro entenda o que a gente diz ultrapassa a compreensão dessa frase. A gente insiste, argumenta e finalmente desiste quando vê que “não vai ter jeito, vai continuar ignorante”. O que não se atenta quando começa essa argumentação é que o outro não está preocupado em entender a idéia transmitida e quem se mobiliza para o convencimento somos nós.

De quem é o problema?

Nosso. Quando persistimos em defender uma ação ou idéia que não faz parte das necessidades do outro e ignoramos que este não está disponível para ouvir, quem está precisando ser ouvido é a pessoa que argumenta. É tanto que não se pergunta nem se a pessoa quer mudar e já estamos bombardeando-a com conselhos ou sugestões de ações que deva tomar. Nos momentos em que começam essas discussões pode perceber que o problema existe para quem busca mudar o outro através da idéia, mas esse outro por si só não entende essa situação como ruim – talvez por ela realmente não ser ruim para ele.

Então porque insistimos em tentar mudá-lo se o incômodo é nosso? Freud(ano) ao escrever sobre os neuróticos – a grande maioria de nós – argumentava que buscamos resolver problemas, paixões e culpas através do outro. Para a psicanálise, a satisfação desses desejos se relaciona com o nosso narcisismo. Ao tentar convencer alguém de alguma idéia não confirmamos somente essa idéia, mas inconscientemente procuramos nossa confirmação. Daí fica mais fácil entender porque pode se tornar tão necessário buscar convencer o outro, pois tentamos resolver nossos problemas através deste.

O que importa é que o processo de mudança de qualquer pessoa passa primeiro por uma necessidade pessoal provocada por qualquer experiência que seja. Ignorar isso pode ser vivenciar frustração desnecessária. A estratégia do convencimento pode até atender nosso narcisismo, mas não provoca mudança efetiva em ninguém.

Pensando essa idéia em Piaget(ano) o desequilíbrio é fundamental para o aprendizado. Quando passamos por situações de desequilíbrio, a nossa necessidade de equilibração nos mobiliza para a construção de novos esquemas. Esses esquemas são modelos de associação do pensamento que recorremos para organizar nossas ações. Então até a forma como sentimos e percebemos o mundo passa por essa compreensão cognitiva dos esquemas construídos.

É por isso que aquilo que é óbvio demais ou argumentações que não fazem parte das nossas necessidades não nos mobiliza para mudanças. O óbvio não é repensado, pois já é associado aos nossos esquemas mentais anteriores. O que geralmente ocorre é que depois de criados eles são só uma forma de perceber a situação e isso ocorre de forma que começa a surgir dificuldade de vê-la a partir de outras perspectivas. Daí o problema de muitas pessoas conseguirem pensar situações de maneiras diferentes ou mesmo conseguir entender o ponto de vista do outro. Esse pode ser mais um motivo pelo qual o convencimento se torna tão necessário; ao convencê-lo ou tentar mostrar a minha visão não me esforço para sair dos meus esquemas mentais – um processo que dá trabalho.

As argumentações que não fazem parte das nossas necessidades não passam pelo processo de reequilibração por não terem sido anteriormente desequilibradas. Ignoramos a nova informação antes mesmo de ser compreendida. Quando não nos dispomos a vivenciar algo que possa provocar desequilíbrio nos apegamos aos esquemas quase como verdades absolutas. Inclusive, diferenciar firmemente certo e errado pode significar apego aos esquemas criados e dificuldade de perceber outros.

Expandir o pensamento para novas percepções além da que estamos acostumados dá trabalho. Dispor-se a isso é dar espaço para criar experiências singulares naquilo que há tanto tempo é vivido. Por mais que possamos nos negar a enxergar, nem tudo é tão óbvio quanto parece.

domingo, 19 de abril de 2009

Balança de três pratos - Parte I

1+1=3. Não podia ser diferente ao se falar de relacionamentos de casais. É comum que isso seja esquecido e daí surgem alguns problemas que se tornam insuportáveis com o passar do tempo. Ela(e) já não me faz tão bem quanto antes, me sinto preso(a) aos ciúmes dela(e), nunca consigo fazer as coisas que gosto quando estou com ela(e) etc. Essas sensações podem perpassar diversos casais quando a balança não está equilibrada.

O que seria isso? A mulher tem os próprios gostos e a própria história de vida antes de entrar num relacionamento assim como o homem. Quando os dois resolvem iniciar uma história juntos, existe um terceiro aspecto que precisa ser cultivado. O relacionamento do casal, a individualidade do homem e a singularidade da mulher compõem essa tríade que faz parte do equilíbrio emocional dos dois. Sem isso, sentimentos de aprisionamento, de se sentir desvalorizado pelo outro e/ ou ausência de motivação podem se tornar freqüentes, principalmente para uma das partes do casal.

Digo uma das partes, pois a individualidade de um acaba prevalecendo em detrimento da singularidade do outro. Não é difícil visualizar a quantidade de casais que isso ocorre – enquanto um parece se dedicar mais ao relacionamento ou busca satisfazer o outro, este outro parece não reconhecer esses esforços. Os desejos do segundo são privilegiados em relação às vontades do primeiro. Numa balança onde pesam somente dois pratos é difícil um efeito de bem estar para ambos em médio ou longo prazo.

É interessante observar que, muitas vezes, ao iniciar um relacionamento, algumas mulheres abdicam aos poucos da vida que tinham para viver para o casal. Com o passar do tempo, as amizades e o lazer que a mulher cultivava perdem espaço para a dedicação à vida a dois. A singularidade começa a ser sufocada, a prioridade se torna o relacionamento e alguns problemas começam a surgir quando essa postura é exigida dos homens. É como se tivesse aquela sensação de “Eu me dedico tanto a ele. Seria bom se ele fizesse o mesmo”.

Embora a vida de casal seja importante para os homens, muitos não estão dispostos a abdicar dos amigos, da cerveja ou do futebol. A mulher não deixa de ter sua importância, mas ela é dividida com a individualidade do homem. Isso não significa que nós não sabemos valorizar o relacionamento, mas que precisamos de nosso espaço. A grosso modo, parece ser mais comum o sentimento de frustração da mulher pela falta de atenção do outro do que no homem. E essa frustração só piora com a diferença nos modos de comunicação dos gêneros.

Watzlawick (1967) estudou os efeitos e componentes da comunicação humana e percebeu que esta tem seu aspecto digital e seu aspecto analógico. O aspecto digital da comunicação é o conteúdo propriamente dito, enquanto que o aspecto analógico se refere ao conteúdo não verbal. Então ao dizermos “eu quero água”, a informação seria o aspecto digital e o tom de voz usado, os gestos, a expressão facial seria o aspecto analógico.

Tendo isso em vista, o que se observa, de modo geral, é que há uma percepção mais apurada dos aspectos analógicos da comunicação na mulher. O tom de voz da mensagem e o uso do corpo para a transmissão da informação são às vezes mais significativos do que a própria mensagem. Uma idéia pode ser dita de diversas formas, e isso tem um peso ainda maior na percepção feminina na comunicação.

Para o homem, o que foi dito se destaca mais do que a forma como foi transmitido. Não temos a facilidade de pensar para adivinhar o que exatamente foi bom ou ruim naquele determinado momento que foi capaz de mudar completamente o comportamento feminino. Os fatos e as palavras falam por si só e, por isso, na nossa perspectiva, é difícil entender o que vocês interpretaram caso o que vocês sintam não seja dito.

Então eu diria para as mulheres que os homens precisam entender o que as frustra de forma clara e objetiva. Muitos de nós temos dificuldade de compreender se fizemos algo que as magoassem, pois o que importa para nós é o conteúdo da mensagem e não a sua forma. Não adianta ficar chata e abusada se não soubermos o que as incomoda.

Para os homens, é importante lembrar que a relevância dos nossos pequenos gestos, do tom de voz que usamos para comunicar algo e das palavras utilizadas pode arruinar ou fazer ganhar o dia da mulher que amamos. Tendo isso em vista, mesmo sem conseguir entender exatamente o que elas querem dizer com as entrelinhas, o nosso esforço real em tentar compreendê-las pode ser importante para elas.

Seja no equilíbrio dos três pratos ou nas diferenças na comunicação, a relação no casal se torna mais fácil quando há um respeito no modo de ser do outro. Brigar por achar que um se doa mais ou por achar que a culpa do relacionamento é responsabilidade do parceiro(a), não resolve os problemas. No fundo, cada um busca amar e se sentir amado assim como ser respeitado pela forma que é, e não pelo modo que o outro gostaria que você fosse.